sábado, 18 de julho de 2009

PIGuistória: Veja, 09 de abril de 1980


Carta ao Leitor

A situação de confronto que se armou na região do ABC, em São Paulo, não parece prometer nada de bom para o futuro próximo. A questão foi marcada, desde o início, pela intransigência. As lideranças sindicais deixaram claro que queriam um greve - sua linguagem não foi a de negociação, mas a do ataque a um inimigo, e sua lista de reivindicações foi apresentada junto com um ultimato. O governo antes mesmo de a greve começar, esmerou-se em fazer desfilar diante de São Paulo todo um cenário de beligerância anti-sindical. Veio a greve, como queria o líder do PT, mas não veio o troco, como queria o governo. Ao contrário do que todos mais ou menos esperavam, uma decisão do TRT paulista - dando, em sua essência, ampla vitória à posição dos sindicatos - fez emperrar os mecanismos que normalmente estariam em marcha conduzindo à intervenção física do governo na situação.

Se a coisa ficasse por aí, o resultado teria sido um duro revés para o governo e sua política salarial. Afinal, os operários obtiveram do TRT até mais que os índices de aumento que haviam pedido em sua última proposta. Eles tinham mostrado toda a extensão de sua força, conseguindo realizar uma greve maciça e altamente disciplinada. Não fora necessária a montagem de piquetes para ser paralisar o trabalho, a ordem pública em nenhum momento foi arranhada e, sobretudo, seus sindicatos continuavam intatos, a salvo da intervenção prometida pelo governo. Este, por seu lado, não apenas se viu frustrado em sua queda de braço com as lideranças sindicais, como também via sua política salarial ser utilizada para atear mais lenha à fogueira inflacionária - com aumentos de salários 7% acima da inflação, não se vê como a espiral possa ser contida este ano.

A recusa dos sindicatos em encerrar a greve, porém, colocou em questão - e reconduziu a situação para a mesma trilha que havia marcado o seu início, a da intransigência. Seja qual for o desfecho, haverá um preço a pagar por ela. Por esse caminho, a discussão de salários no Brasil, em vez de progredir no rumo legítimo da negociação e do jogo de interesses, tenderá mais e mais a se transformar numa sucessão de operações de guerra, com cada lado visando, mais que tudo, a derrota do outro. Em vez de composição, é o choque. Em vez da convivência dos contrários, é a luta pela imposição de supremacia. Esse curso em geral conduz à vitória do mais forte - e, decididamente, não é de testes de força que o país necessita neste momento.

J.R.G.

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